Conhecida terra do morango, Gravatá, a 85 quilômetros do Recife, há uma década praticamente não produz a fruta. Salvo um ou outro agricultor, que produz em mínima escala, os morangos que você vê (e muitas vezes compra) na BR-232 a caminho do município ou no centro, é importado, como dizem por lá. Vêm de São Paulo, Espírito Santos e Minas Gerais como também os que são vendidos no Recife. Mesmo assim, a fama dos morangos ficou no imaginário dos pernambucanos.
As alegações são diversas para o fim da produção: deu praga, o veneno não curou, não houve incentivo e até porque tudo tem seu tempo, disseram alguns agricultores. A famosa Festa do Morango deixou de ocorrer em 2002, devido à escassez da fruta. E já no final, comercializava os morangos importados. O evento foi criado pelo então prefeito Sebastião Martiniano. Com o seu falecimento, assumiu o vice, Joaquim Neto, que transformou a festa em Festival Cultural de Gravatá, englobando toda a produção local. O atual prefeito, Ozano Brito, continuou a festa e assim ocorre até hoje, em novembro.
A fama dos morangos acabou encobrindo a fruta que realmente brota em abundância, há mais de três décadas: o abacaxi. A abacaxicultura toma boa parte do agreste de Gravatá, enquanto que os morangos eram cultivados na outra ponta, o brejo. Nas duas áreas, a diversidade impressiona. O JC visitou o município, ao longo da semana, percorreu alguns roçados e constatou que nesta cidade do Agreste Central de Pernambuco em se plantando tudo dá: de chuchu a flores. O clima e a terra gravataense são generosos.
O incentivo de governo municipal, estadual ou federal nas plantações, quando ocorre, é pequeno mas significativo para algumas culturas, como a do abacaxi. Para boa parte dos que vivem da agricultura familiar, o dinheiro apurado é usado para a alimentação, reinvestido no plantio e, se a safra for boa, fazer reparos na casa. Ter lucro ainda não faz parte da vida do agricultor Paulo Honorato, 58 anos. Mas ele, a esposa, Fátima, 53, e os filhos têm diversificado a produção, no distrito de Limeira. Há 12 anos, Honorato trocou a plantação do morango pela de chuchu. Onde você está vendo chuchu foi morango um dia, aponta Honorato. A esposa completa: Quando a gente casou (há 32 anos), plantou cravo, depois verduras e quando chegou energia e irrigação, morango. Deu bom por uns 5 anos. Aí deu uma praga e o moranguinho ficava preto.
Agora a família planta crisântemos brancos e começou a investir em laranja. Tem 40 pés plantados, mas apenas 12 dando frutos. Por semana, eles conseguem vender 3 mil chuchus. Cada saco com 50 está saindo a R$ 3,50 porque está na baixa temporada, há muita oferta. Quando há escassez, o saco chega a R$ 40. Já 100 laranjas sai a R$ 26/semana. Com as flores, fatura R$ 500/mês.
Praticamente tudo o que é produzido de frutas e flores em Gravatá segue para o Centro de Abastecimento Alimentar de Pernambuco (Ceasa) e de Caruaru. Alguns produtores de flores conseguem vender para outros Estados, como Maceió e Natal. Tem gente também como a agricultora Oneide da Silva, 48 anos, que não está interessada em quantidade. Ela só não quer saber do veneno. É o agrotóxico presente em todas as culturas, a exceção dos orgânicos. Oneide deixou de produzir morango há 15 anos. Conta que era a maior produtora da região. Tirava 400 quilos. Desisti porque deixou de ser rentável e era convencional (com agrotóxico). Vi minha mãe morrer de câncer e tenho irmão alérgico, outro hipertenso. Eles trabalham com flores, ganham mais. Trabalhei com o veneno por muito tempo, como todos até hoje usam. Mas optei por ter saúde.
Desde então, Oneide tem uma horta orgânica, no distrito de Riacho Seco. Por semana, lucra R$ 300 só com a venda de alface, escarola, coentro, hortelã. Ela também comercializa brócolis, alho poró, tomate. E este ano começou a investir em fruticultura (laranja, banana e goiaba). Também investe na pecuária e cria galinhas. Tenho que diversificar para não perder dinheiro. É difícil controlar as pragas e a chuva também pode estragar a produção. A horta de Oneide abastece feiras de orgânicos em Gravatá, Recife e Bezerros. A produção de orgânicos é amparada pela Amaterra. A associação reúne 60 famílias agricultoras. A prefeitura ajuda com R$ 2 mil/mês para o transporte dos orgânicos. Dois programas do governo federal também dão suporte aos agricultores (de orgânicos ou não): o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Articulador social da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural de Gravatá e presidente da Amaterra, o italiano Giovanni Baroni (há mais de 10 anos residente de Gravatá) informou que pelo PAA os agricultores vendem os seus produtos a um preço justo e estável, sem intermediários, à Conab e depois são doados a entidades beneficentes do próprio município. O dinheiro da venda dos produtos este ano passou de R$ 2 milhões. Pelo PNAE, a secretaria de Educação é obrigada a comprar no mínimo 30% da merenda escolar à agricultura familiar do município. Cerca de R$ 300 mil serão empenhados no projeto, este ano.